Marginalização de Travestis expõe grupo a riscos físicos e morais

A falta de oportunidades no espaço profissional e no acesso à educação leva travestis a buscarem, como forma de sobrevivência, a prostituição nas ruas. A exposição a riscos físicos e morais são os maiores agravantes da condição. A marginalização da imagem das travestis gera um empecilho na busca por espaço no mercado de trabalho.

Em muitos casos, o preconceito começa na família. Excluídas, as travestis buscam na prostituição uma maneira de sobrevivência, e, com a profissão, se envolvem em riscos para a saúde, além da exposição à violência nas ruas.

Em pesquisa, o Grupo Dignidade – entidade responsável pela proteção de travestis e homossexuais no Paraná – apontou que o preconceito contra travestis é 72% maior comparado ao contra homossexuais. Somente no ano de 2008, 30 travestis foram assassinadas e enterradas como indigentes em Curitiba. Para mudar essa realidade, o Dignidade passou a criar fichas de identificação com os nomes, endereços e contatos de parentes ou pessoas próximas das travestis que trabalham nas ruas, a fim de diminuir o índice de abandono das vítimas.

Agente de Saúde do Grupo Renascer realiza entrega de preservativos em pontos de prostituição

Em Ponta Grossa, o Grupo Renascer é a entidade responsável por dar auxílio para a população LGBT, servindo como casa de passagem e encaminhamentos básicos. A entidade utiliza o mesmo sistema para identificação de travestis, com o objetivo de oferecer maior segurança às profissionais que atuam nas ruas.

A presidente do grupo, Débora Lee, aponta que, embora o grupo seja voltado para todo o público homossexual, são as travestis e prostitutas que necessitam e buscam maior auxílio na entidade. Há aproximadamente 40 travestis cadastradas na cidade. “A falta de aceitação por parte da sociedade sobre nós é clara, pois associam nossa imagem como usuárias de drogas, prostitutas e portadoras de doenças”, observa Lee.

Débora ainda diz que o cenário das travestis na sociedade melhorou nos últimos 20 anos, mas que isso foi alcançado com muitas lutas por conquista de espaço, e com a existência de pressão. “O que espero é que as travestis mais novas não precisem passar por tudo que já passei ao longo da minha vida”, comenta Lee, que aponta novas oportunidades que estão sendo buscadas. Entre elas estão serviços como manicures, cabeleireiras e esteticistas, oferecidos pelo Grupo Renascer.

TIPOS DE VIOLÊNCIA

Gráfico ViolênciaEm um questionário realizado com as travestis que estão cadastradas no Grupo Renascer, no ano de 2011, foram levantados os dados sobre as principais formas de agressão sofridas por elas. Conforme explica a assistente social da entidade, Fernanda de Almeida, esse questionário será distribuido novamente em 2012 para que possam ser estabelecidos dados comparativos entre a violência contra travestis na cidade de Ponta Grossa.

Conforme os gráficos disponibilizados pelo grupo, as principais formas de violência sofrida por travestis são empurrões e ferimentos com arma branca. A violência psicológica se apresenta em um número maior, com insultos, intimidações e ameaças. Há presença de violência sexual, sendo o estupro colocado em primeiro lugar. A maioria dos agentes produtores dos atos são os próprios clientes. Embora os casos de violência na cidade nem sempre sejam reconhecidos como graves, a assistente social expõe a importância da existência de um grupo voltado para a defesa da integridade das travestis.

“O trabalho nas ruas é difícil, embora aqui em Ponta Grossa a maioria das agressões sejam verbais, ou de jogarem ovos em nós, há outras cidades em que o trabalho nas ruas é muito mais perigoso”, explica a cabeleireira e profissional do sexo Denise Dorneles, que já sofreu fortes agressões físicas e verbais em outras cidades nas quais trabalhou.

LIBERDADE EXISTE?

Acompanhar uma noite ao lado das travestis que trabalham nas ruas desperta duas diferentes linhas de pensamento. Por um lado, é digno ver que, ao invés de utilizar meios ilegais para se sustentarem, elas exercem um trabalho difícil. Do outro lado, é possível percebermos que essa situação acontece por conta da falta de oportunidades no mercado de trabalho, que as exclui, como se houvesse algum motivo sólido.

Alegar que o preconceito, hoje, é raro, soa como hipocrisia. Se fosse verdade, não existiriam tantos movimentos em busca de direitos dentro da sociedade. Quer seja étnico, sexual, regionalista, toda forma de protesto demonstra a existência de uma maioria que toma determinado grupo como marginalizado, no sentido original da palavra.

O caso da homossexualidade ter sido mais aberta nos últimos anos, como no caso da união homoafetiva, não fez com que tal medida deixasse de ser mal vista. No último censo, 60 mil casais homossexuais viviam juntos, independente de um documento que comprovasse uma união. Já no caso do travestismo, a sociedade se mostra ainda mais fechada, manifestando diversas formas de preconceito.

Há, então, o lado daquelas travestis que estão buscando – e alcançando – espaço e respeito, e o lado da sociedade que insiste em dificultar esse caminho. Afinal, a orientação sexual, a cor da pele, a naturalidade, entre outros aspectos, ainda afetam a forma como se é visto na sociedade? Ao que tudo indica, (infelizmente) sim.

Travestis passam noites em pontos específicos da cidade aguardando para realizar os programas

Disponível em: Portal Comunitário (Adaptado)